7ª Festa do Jazz



A Festa do Jazz afirma-se, de ano para ano, como o acontecimento mais significativo do Jazz nacional. O nível musical apresentado pelos alunos das escolas de jazz presentes a concurso não pára de surpreender quem tem acompanhado a "Festa" nesta sete edições. Pela primeira vez este ano, a competição pelos prémios de "melhor combo" e "melhor solista" pôde contar com 2 "escalões" - superior, em que competiram os cursos de Jazz da Escola Superior de Música de Lisboa, o curso de Jazz da ESMAE, do Porto e o Curso de Jazz da Univ. de Évora - e secundário, em que competiram todas as outras escolas de Jazz presentes. Não falando já do alto nível de competência e domínio técnico e conceptual dos melhores, espanta, isso sim, que o nível dos "menos bons" seja, mesmo assim , já tão elevado. Fantástico progresso nos últimos 7 anos.

Vencedores da competição de nível Superior:

Melhor Combo: Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo (ESMAE), Porto.

Melhores Instrumentistas: ex-aequo Luís Cunha (trombone), da Escola Superior de Música de Lisboa e Fernando Bouzón (sax tenor), da ESMAE.

Concurso das Escolas de Música:

Melhor Combo: Escola de Jazz Luiz Villas-Boas/ Hot Clube de Portugal, Lisboa.

Menção Honrosa: Escola de Música Valentim de Carvalho, Porto.

Melhores Instrumentistas: Francisco Brito (contrabaixo), da Escola de Jazz Luiz Villas-Boas
Diogo Diniz (contrabaixo), da Escola de Jazz, Porto e Nuno Oliveira (bateria), da Escola de Jazz, Porto.

O júri foi composto por Tomás Pimentel, Rui Neves e Jerónimo Belo.





Para além da componente competitiva, muito estimulante para todos - alunos, escolas e professores a componente artística revelou esta edição da Festa do Jazz como um ano de "boa colheita" especialmente no que respeita á revelação - pelo menos para mim - de dois jovens e excelentes compositores - André Matos e Ricardo Pinheiro. Cada um deles encorporando no seu espectáculo um músico convidado- em ambos os casos saxofonista e americano, George Garzone e Chris Cheek, respectivamente - e em ambos os casos recorrendo ao mesmo "núcleo duro" na secção rítmica : Demian Cabaud no contrabaixo e Alexandre Frazão na bateria. Se bem que a repetição deste figurino possa indicar alguma ausência de soluções, a música em ambos os espectáculos foi de alta qualidade.
André Matos revelou-se(-me) um muito interessante compositor e um excelente gestor de espaços. Criou uma música solene, uma arquitectura de grandes espaços (as grandes salas de Piranesi estiveram quase sempre presentes na minha imaginação), uma lentidão de acontecimentos musicais própria de um ritual de que se conhecem bem os gestos. Que dizer de um dos meus saxofonistas preferidos? Tudo o que Garzone toca tem o peso da autoridade e da visão musical de um mestre, obviamente. Mas estou convencido que Garzone raramente visita o tipo de conceito musical "habitado" por André Matos. Para mim foi claro o esforço consciente de Garzone em acentuar a melodia e em criar espaço. E é nestas coisas que se revela a inteligência artística de um grande músico na adaptação - intuitiva ou consciente - a uma nova (ou menos visitada) linguagem. De resto já tinha revelado as preocupações com espaço e melodia no workshop que dera na tarde anterior ao concerto . Suspeito que Garzone, durante o workshop falou para todos, é certo ... mas especialmente para ele. Há coisas que têm de ser ouvidas em voz alta...
Na noite seguinte, a última desta Festa do Jazz, Ricardo Pinheiro, cuja música me era de todo desconhecida, apresentou uma música complexa na forma, marcadamente modal e ritmicamente muito fluida (seja o que fôr que isto queira dizer mas , de momento é ao que me soa...). A primeira grande vitória de Pinheiro consistiu em reunir em palco gente da craveira de Laginha, Cabaud, Frazão, Chris Cheek e... João Paulo Esteves da Silva. Este último toca de uma forma cada vez mais inspirada, mais liberta de conceitos tão prosaicos como dissonância ou barra de compasso. As suas linhas e ritmos fluem apenas... e é emocionante ouvi-lo improvisar. Óbviamente que Laginha esteve em grande forma e Chris Cheek confirmou-se como o inspirado construtor de melodias que já me tinha surpreendido em "a Girl named Joe" e, especialmente no CD com a Big Band de Matosinhos.
Do que assisti do espectáculo "Vozes3" ressalta(-me) quanto o projecto me parece conceptualmente débil. Independentemente da qualidade das cantoras e músicos envolvidos está patente uma diferença de atitudes musicais e estilos que acabam por não se fundir nem comunicar entre si.
A Orquestra de Jazz de Matosinhos apresentou-se na sala principal do S. Luiz no fim da tarde de domingo. Um repertório preenchido com obras de compositores portugueses encomendadas pela OJM. De destacar a composta por Pedro Guedes e da qual, lamentávelmente, não fixei o título. Que dizer do trabalho desenvolvido por Carlos Azevedo e Pedro Guedes á frente desta orquestra ao longo dos últimos anos? Extraordinário. Conquistar a confiança musical de gente como Lee Kontiz, Chris Cheek, Mark Turner, Kurt Rosenwinkel, John Hollenbeck, Dieter Glawischnig, Maria Schneider, Rich Perry, Dee Dee Bridgwater ou Jim McNeely não é coisa pouca especialmente num país em que a vocação internacional do seu Jazz é ainda restrita aos 2 ou 3 nomes do costume.
A meu ver esta 7ª edição da Festa do Jazz foi uma das mais importantes desde a estreia deste evento : pela qualidade da música apresenta pelas escolas a concurso, pelo alargamento do número de escolas participantes de nível superior mas também pela apresentação a um público mais alargado de vários projectos nacionais em estreia mais é de estranhar a ausência de interesse que o balanço desta edição da Festa suscitou nos blogs de referência, pelo menos até agora. Diga-se bem , diga-se mal mas diga-se....

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